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quinta-feira, 23 de abril de 2009

A "reforma política" em conta-gotas


O presidente da Câmara de Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), em meio à polêmica sobre o chamado “escândalo das cotas de passagens aéreas” revelou que por cerca de 40 anos (*) vigorou este sistema de utilização “praticamente” livre de passagem aérea. "A regra era essa; de modo evidente, nada subterrâneo, eram permitidas viagens nem sempre ligadas à atividade parlamentar", disse em matéria veiculada pela Agência Câmara.

Na mesma reportagem, Temer destacou ainda que apesar das crítica não será possível qualquer tipo de questionamento jurídico a respeito. Isso porque “os deputados que usaram os créditos de passagens aéreas antes das novas regras, e portanto sob normas que não eram claras nem precisas, não cometeram qualquer tipo de ilícito".

Ele ressaltou que será aplicado nesse caso o mesmo entendimento decidido para a verba indenizatória: se não foi ferida regra objetiva, não houve ilícito de qualquer natureza. Quanto a isso, explicou Temer, "os parlamentares podem ficar tranquilos.”

O aparecimento periódico do “escândalo da hora” vem obrigando o Congresso Nacional a implantar uma “reforma política” com base na regra “sem querer, querendo” praticada pelo personagem Chaves, há muitos anos exibido no Brasil pela rede de televisão SBT. É político o tema da administração do dinheiro de todos nós pela burocracia do parlamento brasileiro.

Sem entrar no mérito do que foi anunciado nesta quarta-feira pelo deputado Temer (“A Câmara vai tornar de uso exclusivo dos deputados e assessores a cota parlamentar de passagens áereas, extinguir as sobras de créditos nessas cotas, restringir o uso para viagens nacionais e divulgar na internet a prestação de contas de todos os auxílios pagos aos deputados”- Agência Câmara), a este fato liga-se o da “eterna” reivindicação (senso comum) a respeito da realização de uma “reforma política” no Brasil, que em resumo mexeria na legislação eleitoral e, no meio disso, poderia instituir o financiamento público de campanha.

Mas será suficiente uma “reforma política” nestes moldes? Ou ficará aquém de qualquer expectativa de real mudança? Alterar esta convivência do parlamentar com a sua atividade cotidiana não significa ir mais longe do que “reformar” aqui e ali?

Movidos pelo “escândalo da hora” as autoridades de plantão, no caso o deputado federal Michel Temer e o senador José Sarney, respectivamente presidentes da Câmara de Deputados e do Senado, usam o “conta-gotas” (gotímetro) para implementar as pequenas mudanças que, se somadas, resultam na “reforma política” possível de passar por um Congresso Nacional constituído do modo que este e outros no passado o foram.

Pensar e fazer “reforma política” requer mexer na superfície. Ir mais fundo visando profissionalizar, para cobrar, a atividade político-parlamentar no Brasil obriga a alterações bem mais profundas do que permite a palavra “reforma”.


Entre as modificações deveria ser introduzido um modelo de fiscalização onde o cidadão (eleitor a cada dois anos, consumidor diário, contribuinte sempre) possa ter mecanismos capazes de, via indicadores a serem acordados, determinar não apenas a qualidade do trabalho parlamentar como também punições, entre elas o afastamento antes do término do mandato, ao político profissional que não for, de fato e não apenas de direito, um servidor da sociedade que o elegeu.

Pessoalmente não veria problema em pagar muito mais por mês a um parlamentar no exercício legítimo de seu mandato nascido da vontade popular. Isso caso o chamado “custo-benefício” fosse favorável ao conjunto da sociedade, principalmente às camadas com menor e nenhum poder econômico. Do contrário, precisamos continuar pressionando para exercer controles rígidos, no mínimo os mesmos que as leis, elaboradas e votadas pelos parlamentares, obrigam legitimamente a sociedade a cumprir.

Quero ter também esta mesma legitimidade na condição de cidadão que, repito, é ao mesmo tempo consumidor e contribuinte da atividade política, cujo custo econômico deve ser respeitado por cada político profissional deste país.


(*) Prevalecendo esta conta do deputado Michel Temer, este sistema de passagens aéreas usados até aqui pelos parlamentares foi criado em 1969, período da didatura militar (com apoio civil e empresarial, ressalte-se). Então algumas figuras que apoiaram aquele regime e que ainda estão vivas e atuantes também se beneficiaram deste esquema. E se todo mundo sabia (inclusive setores da imprensa em Brasília), porque só agora ocorreu a denúncia? Será que saiu alguma matéria há tempos na mídia e a minha vista e capacidade de consumo $$$$ não alcançaram?

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