O Conselho Nacional de Educação (CNE) remeteu e o gabinte do ministro da Educação recebeu nesta quinta-feira (02/06/11) o Parecer 15/2010, com texto reexaminado pelo CNE, para a apreciação e (ou não) homologação por parte do ministro Fernando Haddad.
Pela nota divulgada hoje pelo CNE, e abaixo reproduzida, dois pontos são decisivos para o Conselho: contextualização da obra (seja ela qual for) dirigida ao sistema de ensino, em especial o público, e o respeito à legislação interna e externa firmada pelo Estado brasileiro contra o racismo.
Continuamos aguardando os próximos acontecimentos e , ao meu ver, cabe ao ministro ser coerente e homologar o parecer, assim como posicionou-se a respeito do kit contra a homofobia e o livro "Por uma vida melhor" cujo primeiro capítulo destacava a relevância contextualizada do falar popular.
Lembro que o início do caso "Caçadas de Pedrinho" aconteceu em 30 de junho do ano passado, quando foi protocolada * pela Ouvidoria da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) junto ao CNE denúncia feita por Antônio Gomes da Costa Neto, técnico em gestão educacional da Secretaria de Educação do Distrito Federal, que é mestrando na Universidade de Brasília (UnB) na área de educação e relações raciais. Costa Neto solicitou que a secretaria onde trabalha não usasse " livros, material didático ou qualquer outra forma de expressão que, em tese, contenham expressões de prática de racismo cultural, institucional ou individual". O próprio MEC através de nota técnica da sua Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade reconheceu ser coerente o fundamento da denúncia feita por Costa Neto, cuja crítica ao livro "Caçadas de Pedrinho" focaliza-se nas formas de tratamento dadas, pelo autor Monteiro Lobato, à personagem negra Tia Anastácia.
Em março próximo passado, a escritoria Ana Maria Gonçalves demonstrou através de pesquisa precisa o que de fato pensava o escritor Monteiro Lobato a respeito de negras e negros e a sua simpatia explícita pela organização Klu Klux Klan, que matava negros e negras nos Estados Unidos em uma prática de crime contra a humanidade.
Na época, destaquei neste mesmo blog que as reações ao Parecer 15/2010 tinham também um fundo econômico e um flagrante interesse da Editora Globo (empresa das Organizações Globo) em não perder a participação em um mercado avaliado em cerca de R$ 1 bilhão. Pelo jeito, desta vez, a chamada grande impresa/empresa não seguiu a máxima da fonte do caso Watergate que disse a Bob Woodward em uma garagem em Washington (DC) : "siga o dinheiro"!
* Ofício nº 041761.2010-00, relativo ao Processo 00041.000379/2010-51.
NOTA DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
REEXAME DO PARECER 15/2010
Em setembro de 2010, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação aprovou, por unanimidade, o parecer 15/2010 com orientações às políticas públicas para uma educação antirracista, no qual se fez uma referencia ao livro “Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato.
A reação de setores da sociedade levou a Câmara de Educação Básica a aprofundar as bases do parecer, no sentido de ressaltar a importância da contextualização crítica do autor e da obra literária, sobretudo nas novas edições de livros considerados clássicos, produzidos em outro contexto no qual pouco se falava e se reconhecia a existência do racismo e do preconceito racial.
O Conselho Nacional de Educação entende que, assim como é importante o contexto histórico em que se produziu a obra literária, tão ou mais importante é o contexto histórico em que se produz a leitura dessa obra.
Nos termos do voto da relatora, conselheira Nilma Lino Gomes : “É responsabilidade dos sistemas de ensino e das escolas identificar a incidência de estereótipos e preconceitos garantindo aos estudantes e a comunidade uma leitura crítica destes de modo a se contrapor ao impacto do racismo na educação escolar. É também dever do poder público garantir o direito à informação sobre os contextos históricos, políticos e ideológicos de produção das obras literárias utilizadas nas escolas, por meio da contextualização crítica destas e de seus autores.
Uma sociedade democrática deve proteger o direito de liberdade de expressão e, nesse sentido, não cabe veto à circulação de nenhuma obra literária e artística. Porém, essa mesma sociedade deve garantir o direito à não discriminação, nos termos constitucionais e legais, e de acordo com os tratados internacionais ratificados pelo Brasil.
Reconhecendo a qualidade ficcional da obra de Monteiro Lobato, em especial, no livro Caçadas de Pedrinho e em outros similares, bem como o seu valor literário, é necessário considerar que somos sujeitos da nossa própria época e responsáveis pelos desdobramentos e efeitos das opções e orientações políticas, pedagógicas e literárias assumidas no contexto em que vivemos. Nesse sentido, a literatura, em sintonia com o mundo, não está fora dos conflitos, das hierarquias de poder e das tensões sociais e raciais nas quais o trato à diversidade se realiza”.
Brasília, 01/06/2011.
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